quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Justificativas de uma tagarela.

Sempre fui daquelas tagarelas, que quando toma a palavra exagera e dispara sem freio... Quer dizer, com freio sim, mas daqueles tranquilos e respeitosos, que vão crescendo de forma saudável e gradativa. E acho que tem uma confusão alheia comum. Muitos pensam que pelo fato de alguém gostar muito de falar não ouve, e assim dizem pros tagarelas "Você tem que aprender a ouvir.". Claro, deve existir tagarelas que não ouvem. Só que não são todos. O fato de querer mais tempo para esclarecer alguma idéia ou acrescentar algumas firulas não nos tira o tempo de ouvir, só prolongamos as discussões e conversas, abrindo até mais possibilidades de exposição de idéias...
Ouço sim, mas falo também.
Oscilações equilibradas são muito saudáveis ao espírito.

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

"... o mundo é gay e digital... !!"

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Os doidos de interior

Entre tantos motivos que me atraem a vida no interior, um que me arrebata é a vontade de ver os doidos mansos nas ruas. Toda cidade tem os seus, só as capitais não têm - não doidos, mas mansos: o juízo sensível deles não deve suportar o frenesi urbano, por isso são tantos os dementes, assassinos, comedores de gato e neuróticos que vagam pelados pelas calçadas e avenidas.
Minha mãe conheceu vários nas várias cidades em que morou. Um mesmo era Jipe, salvo engano, de Jequié.
Era Jipe porque achava que era um Jipe. Fazia tudo que um carro faz: estacionava, pegava trânsito, até morria. Uma vez quando minha mãe viajava com os pais e irmãos numa caminhonete, viram Jipe no acostamento. Tinha faltado gasolina. Meu avô ofereceu carona e Jipe seriamente corrigiu: "Carona, não. Reboque".
Tinha Josina também, uma doida de Poções. A loucura dela era típica, cinematográfica: vivia vestida de noiva à espera do amado que, é claro, não chegava nunca.
Tia Gina, irmã de minha mãe e minha madrinha, gostava de atentar Josina. Pegava jornais velhos na rua, chamava ela e dizia "Ei Josina, carta de seu noivo!". A doida vinha correndo, pedindo pra ela ler e tia Gina criava a carta na hora, dizendo mirabolantes declarações de amor pra ver Josina chorando de emoção. Sorte de Josina.

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

contemporaneidade

até onde é nosso tempo
o tempo do agora
o contemporâneo

que se deixa fugir por efemeridades
perdendo da seiva natural
sua profundidade

rápido, automático, digital
corra, coma, beba, ouça... seja?
passa, repassa, o quê?

resta o ínfimo reviver
o processo
aproveitamento
a fluidez saudável
do viver






no sol pára
apara o sol

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Meu tanto, quanto tempo

foi tanto, amor, foi tanto
um quase amor, meu quase encanto
tento descrever com este alento
inventando um canto vagabundo
que do fundo e volta pra dentro
porque dentro não precisa ver o mundo
e no fundo, meu tanto, teu acalento
passeia comigo nas cidades que invento
descobre os segredos que eu nunca conto
sussurra meus sonhos, moinhos de vento
até eu cair em mim, depois de tanto
e acordando sem ti, enxugo meu pranto
e te enterro (eu tento, eu tento)
nas folhas das folhas do tempo

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

E o vento me leva, mostrando-me a rota, enviando-me ao meu destino, só meu.
Por caminhos diversos tenho passado, mas não são caminhos sem volta, persigo uma trilha que aos poucos vou conhecendo e ao descobrir lugares e situações ricas, por ali passo outras vezes. Podendo passar num intervalo de um ano ou de uma semana, mas passarei ou passo. O importante é que tenho descoberto a relação entre os lugares que me agradam, não sei com o quê o poderia ser comparado. A um bairro, ou país? Sei que certos traços, certas cores, certas pessoas, certos sabores, me atraem e tenho aprendido a valorizá-los mais do que antes o fazia. Muitas vezes deixamos que um pensamento da maioria afete no que temos de individual, próprio e, portanto, único...
A grande fotografia do mundo, o movimento do mundo, seus perigos, os desenvolvimentos, o crescer, murchar, nascer, morrer, todo o processo me encanta e tem me enviado a diferentes paisagens, caminhos.
Fotografo, danço, grito, falo baixo, agarro, recuo, me envolvo, beijo, abraço, treino, supero-me...


"Não temos perpectiva, mas o vento nos dá a direção
A vida que vai à deriva é a nossa condução
Mas não seguimos à toa, não seguimos à toa..."

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

domingo, 29 de julho de 2007

Bairro Paixão

Depois de inúmeras tentativas de reconciliamento, seu Silva, já com seus 74 anos incompletos, consegue uma brechinha mais de dona Maria.
Dona Maria fora alertada pelo seu filho que seu Silva não era flor que se cheirasse quando tratava de mulheres. Uma vez vira seu Silva no bairro Paixão, longe de onde morava, e o filho de Maria resolveu segui-lo, intrigado com o caminho que o namorado de sua mãe tomava.
Por incrível que parecesse aos seus olhos, viu, o gaúcho cavalheiro, que enchia a casa de sua mãe sempre com frutas, verduras, legumes, fazendo o mesmo, agora em outra casa, do outro lado da cidade, no bairro Paixão.
Indignado, Pedro contou tim tim por tim tim para dona Maria, que sentiu-se traída, corneada. Decidiu não mais dar trela para seu Silva. Ele aparecia na sua casa com compras e ela, irritada, mandava-o embora, dizia que não era mulher de precisar da ajuda masculina para sobreviver, tinha dinheiro para comprar suas comidas e não precisava das suas "esmolas". "Suma daqui" esbravejava a senhora.
Até que um dia, numa tarde fria premeditando uma noite congelante, seu Silva aparece na casa de dona Maria pedindo que esta o abrigasse, que dormiria pela sala mesmo, sem precisar de mais, pois só a quentura de sua casa bastava para aquecê-lo naquela noite fria, já que a sua moradia não era quente suficiente.
Dona Maria com seu jeito rude não conseguiu negar tal pedido, tão mole é seu coração por dentro, e liberou a estadia do homem que havia traído-a. Perguntou, antes de liberar que ficasse, se estava indo ainda ao bairro Paixão. Seu Silva sem titubear respondeu negativamente, quase a beijar seus pés.
Dormiram em paz até as 4h da manhã, quando dona Maria resolveu tirar concretamente aquela dúvida que pertubava sua noite: haveria ele parado mesmo de frequentar Paixão?
Sem mais, teve uma idéia e foi colocá-la em prática: remexeu os bolsos de sua calça na esperança de descobrir alguma pista. Ôpa! Uma nota fiscal. Supermercado Pague Bem, rua Alfredo Dias número 34, bairro Paixão.
-Então o safado estava mentindo? E eu tenho cara de chifruda?Ah, mas agora ele vai se ver comigo - pensou dona Maria.
Aos tabefes acordou seu Silva e querendo mesmo que ele virasse picolé, jogou suas roupas pela janela e gritou: "Saia daqui, seu velho safado! Você acha que eu tenho cara de mulher chifruda? Nunca mais volte na minha casa, seu sem vergonha ... ".
Assim que ele ia saindo ela perguntou, só para confirmar.
-Me diga, essa notinha não é do Supermercado Pague Bem no Paixão?
Ele, corcunda e trêmulo afirmou com um leve balanço da cabeça e um baixinho "sim".

terça-feira, 24 de julho de 2007

a alma dança




O processo de libertação continua a cada escala, de dia, segundos, estações... Nas articulações, dedos, pernas, braços, quadris, o desenvolvimento cresce aos poucos e a descoberta surge.

No que se concilia, o encaixe acontece, do sentimento com movimento, ou vice-versa.
Dançamos não só com o corpo, as palavras, idéias, sons, desejos, imagens têm vida e criam a cada instante coreografias ricas em compassos, pausas, ritmos, intenções...
Nossa história dança, nosso choro dança, a desepedida, o encontro, o desencontro, o desepero, o amor, a descoberta, a dúvida, a alma dança.
Que se assuma o cenário, os sons, as articulações e o espetáculo comece, sem fim, um espetáculo de público incerto, flexível.

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Não há desenxabido que não se desenxabide com seu desenxabimento.


desenxabir:1 retirar o sabor 2 tornar monótono, sem graça; desanimar [...] *

*Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa

domingo, 22 de julho de 2007

Não adianta lavar, enxugar, perfumar-se. Uma vez dentro, o cheiro ganha vida e é exalado sem que ao menos autorizemos. Nos acompanha idependente de cronologia ou quilometragem.
E depois de percebido abre portas para os outros sentidos.
Imagens, cores, texturas, vozes, músicas, mágoas, amores... E assim enxergamos olfativamente.

terça-feira, 17 de julho de 2007

Cadê tu, tatu?

E a égua rosa?
Aquela dos pesadelos chiques

Por onde anda a que maltrata os homens?
E a flor presa ao seus maltratos?

Ah, as piadas...
Por onde andam os travestis?

Bacana, Joana...
Dama da livre poesia

Dê-nos mais uma de suas fantasias...

domingo, 15 de julho de 2007




na "espiralidade" da vida
seguimos em linha curva
uma linearidade distorcida

sábado, 7 de julho de 2007

"Até o sol raiá"

Maratonas Anima Mundi. Que delícia.
Acho que por não ter pego esses 15 anos de Anima Mundi, me encanto tanto com o evento. Vejo cariocas que mal sabem do acontecimento, para mim tão rico e imperdível.
Animações do mundo inteiro, curtas, longas, papos animados, exibições de animações antigas e recentes, fantástico.
Neste 15º Anima Mundi, os brasileiros arrasaram. Foi o primeiro ano em que mais curtas brasileiros foram selecionados. Sempre são os que mais se inscrevem, naturalmente, mas pela primeira vez foi a maioria na seleção. E, sem patriotismo exacerbado, todos que vi mereceram elogios sinceros.
O mais marcante para mim foi "Até o sol raiá".
Fui assistir a sessão dos "Curtas 4" por ironia do destino. Estava tomando uma caipirinha pouco antes de ter decidido ir para casa quando uma mulher passou oferecendo ingressos para a sessão das 21h. De primeira recusamos, todos da mesa, pois já haviam comprado, menos eu. Eu não queria ir, a princípio. Só depois de alguns segundos pensei "Ah, de graça...". E fui.
E foi por causa dessas frações de segundo que agradeço a oportunidade de ter visto algo tão "revolucionário", sensível e bonito, como o curta "Até o sol raiá".
Antes de começar a sessão, a apresentadora chamou dois diretores do curta pernambucano, que estavam no público, para falar um pouco. E lá foram os dois, garotos, com sotaque arrastado e fala pouco ofegante, dizer do nervosismo e felicidade que era poder estar participando do Anima Mundi. Foram muito simples e torceram para que gostássemos do seu trabalho.
Como puderam torcer? Até agora me pergunto isso. Será que não têm noção da maravilha que é o curta?
Sem pretenção de usar termos técnicos ou acertar na crítica, mas com olho de espectadora digo que a animação é no mesmo nível de Shrek , computadorizada e perfeitamente detalhada. Ilustração belíssima. E a história, então... sensibilíssima!
Lampião e Maria Bonita, como bonecos em miniaturas pernambucanos, introduzidos por um cordel belissimamente recitado e elaborado. Um gozo, só vendo...
Me emocionei no final, de orgulho, do Brasil e do Nordeste.
Usando de recursos tão recentes, tão informatizados, para retratar uma história cultural, linda e ancestral do nosso povo.
Acha-se no Google. Procurem, assistam o trailler.
Que sejam tomadas cada vez mais iniciativas como essa, e que recursos sejam aplicados em jovens como eles, dedicados, competentes e sensíveis.

domingo, 1 de julho de 2007

Êta filme retado.

Como pode a vida nos pegar assim de surpresa?
Tenho me sentido dentro de uma sala de cinema, assistindo a um filme com aqueles óculos que nos permite "3Dear".
É, porque a vida tem aparecido para mim como mais um enredo, um roteiro bem elaborado, com uma fotografia belíssima e personagens pra lá de complexos.
Como uma espectadora chata e crítica, me pego perplexa em cenas onde não há tempo de digeri-las ou analisá-las, só senti-las.
Mas nos momentos em que a poeira abaixa, a música lenta toca, e meus batimentos saem do ritmo sincopado para um 3/4, uma valsinha, penso: ai, como será que terminará esse filme?
Que o diretor saiba o que está fazendo...

quarta-feira, 27 de junho de 2007

Uma piadinha besta

Era a festa de uma bicha glamourosa, celebração de qualquer coisa - aniversário, nova coleção de uma griffe, pouco importava o motivo. Sabe-se apenas que as ricas convidadas haviam preparado seus trajes com algumas semanas de antecedência, tudo obras com assinaturas famosas, alta costura mirabolante, exageros em alegorias carnavalescas.
A bicha anfitriã oferecera sua mansão de dez aposentos, jardim de raras bromélias e palmeiras imperiais com piscina semi-olímpica revestida de mármore para receber as convocadas à seleta comemoração.
Uma promoter foi contratada para ficar à entrada com a função de antecipar, munida de microfone, as chegantes e seus visuais.
"Atenção, gentem, que chegou a primeira bicha, abalando as estruturas em sua limusine 'Aurora Boreal'. Ela está vestida de Ariel, a sereia em fase punk", anunciava a bicha porteira. "Chegando agora, atenção gentem, Laleska Latielly, descendo da limusine 'Motivo Mexicano' no seu traje 'Frida Khalo visita Almodóvar".
E enquando registrava-se as aparições espetaculosas, a vizinhança católica apostólica romana ia enfurecendo cada vez mais com a barulheira pagã. Alta madrugada e nenhuma resposta às reclamações. Um vizinho militar resolveu acionar a polícia.
"Parece que a última remessa da bicharada aterrissa, gentem! Uma limunise enorme, em visual ultra moderno coberta por uma lona de cor salmon. Estão descendo dez... Vinte bofes fardados! AI! É A POLÍCIA, CORRAM BICHAS!!!"
E as meninas correm com a explosão da testosterona que lhes resta, deixando pra trás pena, pluma e purpurina. A polícia prende todas; algumas encenam um drama de novela, outras desmaiam, umas ainda agarram os policiais gritando "Me algema que eu gamo!".
A mais tímida delas, vestindo uma esvoaçante saia de gaze e filó azuis, bafa um canudinho e entra mansamente na piscina. Tentando se esconder, respira através dele no cantinho da piscina enquanto espera a poeira baixar. Um policial resolve fazer a última vistoria e já de longe avista aquela imensidão de panos boiando. Chega em passos leves e sem pressa cutuca a bicha com seu cassetete: "Já te vi, bicha"
A bicha vira-se, emerge de seus panos aquosos e, jogando a cabeça pra trás, exclama feito rainha: "Agooora? Mas eu sou Iemanjá e acabei de chegar..."

terça-feira, 26 de junho de 2007





Dedos curiosos à procura
Confundem carinho com textura

Mas é no calor da formosura
Que encontro a beleza da temperatura

segunda-feira, 25 de junho de 2007

Cão sem dono

Vou falar um pouco do filme que vi recentemente. Não sei o porquê, mas me deu vontade.
Sem qualquer indicação, quer dizer, minto, com a indicação do JB, onde sempre olho a programação e de certa forma me baseio nas críticas, sempre um tanto quanto parecidas com as minhas, fui assistir ao "Cão sem dono". De um diretor que não conhecia e com um elenco tão desconhecido quanto, me surpreendeu.
Os primeiros minutos do filme nos deixa na defensiva. Bom, falo por mim, espectadora relativamente chata. O diálogo é espontâneo demais, isso me deixou com um certo receio, de início. Porque mais difícil que decorar um texto e dá-lo com intenções, é assumir um caráter totalmente informal e deixá-lo não-forçado. Mas conseguiram, e de maneira surpreendente.
O filme é todo muito leve e confortável de ser sentido, assistido. Os diálogos, cheguei a essa conclusão, eram todos improvisados, limitados a temas (não é possível que houvesse um texto pré-decorado). Isso fez com que me sentisse dentro do contexto, sentada numa roda de amigos, tomando uma cerveja, trocando uma idéia, conhecendo a casa do novo conhecido...
A atuação é prazerosa de ser acompanhada. As cenas não são forçadas, o sexo não é forçado, a conversa com o porteiro-pintor e com o cachorro-amigo também não são, ...
Enfim, um filme que vale a pena ser visto naquele momento que não sabemos se vamos ou para a casa de um amigo ou para o cinema. Opte pelo cinema e pelo "Cão sem dono".

sábado, 23 de junho de 2007

ACM

E o homem não resistiu a essa onda de boatos, menino(a)?
Afe, que figura pesada esse tal de Toninho Malvadeza; eu e meia Bahia matamos o cara, mesmo assim sobreviveu. Aqueles amuletos no seu pescoço têm força, viu? Deus é mais...

Pois então, o "hômi" não morreu não, AINDA não. Agora é só esperarmos que não vença nenhuma eleição de cá pra lá.

sexta-feira, 22 de junho de 2007

"A masculinidade cobrada numa criança menino."
"E as relações disso com a homossexualidade."

Pensei numa idéia que se resume resumidademente -pleonasmo proposital- naquelas duas frases. A idéia surgiu no ônibus, então, para não esquecer, peguei imediatamente o celular e anotei o que poderia achar ser suficiente para um pouco mais tarde, em casa, aqui, pudesse redigir integralmente ou não o que havia passado em minha cabeça.
Só que agora me ocorre ser um pouco polêmica a questão. Então deixo que seja o desenvolvimento da questão realizado pelos (as) leitores (as), eu agora não estou pra polêmicas...

quarta-feira, 20 de junho de 2007

E graças a sei-lá-quem, Salvador se livra da maior força coronelista que imperou até hoje, uma quarta-feira, dia 20 de junho de 2007: Antônio Carlos Magalhãe, Acm, MORREU!!!!!!

Sim, gente, M-O-R-R-E-U!!!

Chega não consigo respirar de tanta alegria!

terça-feira, 19 de junho de 2007

Todo dia ela faz tudo sempre igual...

Observações da vida cotidiana.

Aos berros, uma senhora deixa os arredores a par de sua conversa no orelhão:
-Não, eu não suporto mais isso. Essa mulher vive na minha casa e não olha para mim! Você vai ter que se separar dela, está ouvindo, meu filho? Eu não aguento mais!!!!


Conversando com uma mulher muito estranha de camisa comprida com gola, saia curtíssima, rosto incomum, nada simétrico, uma senhora morena explica-lhe, com ares de indignação e desaprovação:
-As crianças ficam loucas, largam escola. Claro, de 400 a 500 reais por semana. Até meu afilhado, menina... Menino bonito, B-R-A-N-C-O, alto, se meteu nessa...

Hoje, no meu parque de diversões, meu laboratório teatral, psicológico e sociológico, o Largo da Carioca, vi uma cena única: um homem corria da rua em direção ao interior do largo de forma angustiante. Nem tão rápido o quanto conseguia, com medo de que, involuntariamente, perdesse o controle corporal, e nem tão devagar porque a urgência de se chegar ao lugar procurado era demais. O corpo mostrava que as contrações se localizavam na região abdominal e glútea... Seu rosto mostrava a vergonha mas também a despreocupação com esta, pois afinal, era urgente seu caso. Não de vida ou morte, mas de pequeno constrangimento ou exposição íntima em praça pública. Pela cena senti a graça, por ele, compaixão.

segunda-feira, 18 de junho de 2007



iluminai-me, luminosa lua
traze-me sua firmeza, seu encanto
no contraste profundo, encontro a beleza

proeza do pranto

Encontros e desencontros.

sábado, 16 de junho de 2007

"19 vezes eu". Capítulo segundo.

Com 19 anos recentemente completos, quase duas décadas, é natural surgir aquelas pequenas crises existenciais quanto ao tempo de vida e o que será/foi feito durante este. E para exagerar bem, surgem aquelas retrospectivas também. Sim, aquelas que normalmente vemos em filmes ou ouvimos em histórias de quem quase chegou no "céu" e assistiu a um filminho com sua vida sendo o tema principal. Pois aqui tentarei transcrever tal retrospectiva. Portanto, seguindo a sugestão, aqui vai, "19 vezes eu".

- Capítulo segundo


Decidi mudar de colégio no Ensino Médio, o Portinari era um antro de patricinhas e mauricinhos e estava um pouco irritada com aquilo, me descobrindo cada dia mais rasa por estar convivendo naquele espaço de hipocrisia hierárquica.
Colégio Oficina era o famoso por ter sido fundado por professores alternativos, antes funcionando numa casa, onde nego subia em árvore, fazia pequenique, etc. Já viram que me encantei com a poesia apresentável do colégio.
1º e 2º anos no Colégio Oficina. Grêmio Germinal, grêmio Sapato 37 ( viva Raul!!), passeatas, apelido: Che (Joana é a única sobrevivente que revive estes passados), Magali Mendes, Manxa, João Pedro, Denise, Joana, Pedrão, Diego, Priscila, Lívia e muitos outros foram aparecendo, surgindo e se envolvendo, nos envolvendo, construindo algo que até hoje é sólido e prazeroso. Hoje é memória, e a memória vive, mas o presente também nos interessa e muito.
Foi nesse período que descobri o circo, o circo Picolino, o trapézio, Fafá, Marcinho, a estrela a dois, a cambalhota a dois, o cristo, o fogo, a contorção, os batimentos acelerados preparados para a entrada no picadeiro...
Abandonei o inglês para fazer aulas no Picolino, onde minha mãe também ingressou junto, mais para exercitar o corpo que para sugar dos movimentos.
Aí, no ano seguinte, 2004, saí do circo por motivos que se aqui acrescentados, param todos de ler agora mesmo. "Vou fazer dança, quero muito dançar, não tiro isso da minha cabeça por nada!".
Sim, dança. Lá fui eu. Dança moderna. Martha Graham. Depois.... "Fulana - gente! Esqueci o nome da professora- será que posso entrar na turma de ballet clássico?". Minhas batatas foram apalpadas, com gosto, para depois ouvir que sim, tinha força para ingressar no robotismo que foram os 4 meses de ballet clássico.
Não aguentei e voltei para o circo, agora só no tecido.
Depois saí e voltei para a ginástica olímpica - esqueci de citar meu ingresso nela nos anos do Portinari, onde descobri com uma amiga que amávamos a arte e vivíamos dando estrelinhas nos corredores. Eu, magra e comprida ao lado de várias crianças, brincando e se pendurando pra lá e pra cá, e eu suando, malhando, igual a uma "cuscuzeira", como, um dia, disse uma das crianças para mim.
Meu pai, numa visita a Salvador, me ofereceu a oportunidade de passar um ano fora fazendo intercâmbio, coisa que de início me assustou, de medo e felicidade. Estava chegando o momento de começar a putaria do 3º ano no Oficina, pois como já conhecia os que passavam por tal tortura, queria por tudo fugir daquela prisão massacrante. O intercâmbio era a melhor oportunidade.

Tanto carro

Um mar de carros. Seis e meia da tarde de uma sexta. Entre chuviscos que vão e voltam, dezenas de automóveis disputando vagas movediças. Calor. Sinfonia regida pelo furor das buzinas.

Eu penso nisso tudo, mas nada me estressa. Consigo me divirtir vendo. Estou sozinha. Sinto o calor e deixo a janela pela metade. Ouço e vejo o vizinho do Monza vermelho praguejar o trânsito e suar que nem um porco. Tem uma moça numa Pajero atrás de mim que permanece impassível dentro de sua bolha selada. Ela canta alguma coisa, percebo pelo meu retrovisor. Pelo dela, ela retoca o gloss.

Pra quê tanto carro, pra onde eles vão, meu Deus, perguntariam os olhos do meu Drummond da modernidade.

Tem um belo casal que conversa animadamente à minha esquerda. Minha vontade é de ficar olhando; estão tão lindos, mas não se pode olhar pra dentro do carro dos outros, é quebrar a cartilha de ética dos motoristas civilizados.

A fila do Monza vermelho anda e a minha fica parada, como previsto em outra cartilha, a de Murphy, a mesma que diz que a parte do pão com manteiga cairá sempre pra baixo.

Uma saveiro com meninos de sunga sobre a carroceria vira minha vizinha. Era de lá que vinha o som do Asa de Águia. Eu mereço. Meu olhar esbarrou com o de um deles, um meliante, diria meu pai, com uma garrafa de Birinight em uma mão e fazendo sinal com a outra para eu baixar o vidro, o que eu fiz imediatamente.

- Quer uma cerveja? - perguntou.
- Claro - respondi, natural.

Ele jogou a lata no carona, eu abri e bebi. Estava um pouquinho quente. Ele quis conversar, desceu do carro e veio até a janela, mas era feio e estava bêbado. Pra me salvar, o sinal abriu e eu falei: "Melhor você voltar pro carro, tchau".

E segui, até estacionar em novo engarrafamento, novas estórias.

* Texto publicado no www.intercom-ne.blogspot.com
A dádiva
O egoísmo
O egocentrismo...

Em que se baseia o amor?
Que amor amamos?
E com que amor desejamos sermos amados?

Merece ele essa pressão
da cobrança, da vaidade?

Que depositemos essas energias noutros caminhos,
já que são tantos os existentes...

Deixemos o amor livre para ser gozado.

quinta-feira, 14 de junho de 2007

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Cachaça Cinema Clube



Fechando com chave de ouro ( o meu dia ) e as apresentações dos curtas e médias metragens do Cachaça Cinema Clube*, o último curta emocionou a todos com uma seleção sensível e popular de recordações amorosas relacionadas a músicas. De Heavy Metal a Zezé de Camargo e Luciano os cantos foram cômicos, espontâneos e emocionantes.
O que mais me marcou, e que fechou o filme de forma belíssima, foi o depoimento de um senhor negro e expressivo que contava seu caso de amor antigo e frustrado, lembrado até hoje.
Era uma italiana. Branca, linda. Foi em um dia que "eu se apaixonou". "Se apaixonou" mesmo, de chorar, pedir para casar, se declarar... O pai não permitiu pois era desempregado, ou seja, como sustentaria sua filha? Mas depois da insistência sincera de ambas as partes foi concedido o pedido.
Ela morava num apartamento alugado. Não sei mais como se dá cronologicamente a história, ele mesmo havia se perdido, ou sido "editado". Ele teve de ser transferido para algum lugar em serviço ao exército. Portanto ficou distante durante um tempo da mulher de sua vida, por quem havia batalhado aos 18 anos. Cumprido o prazo "do exercício de cidadão", corre atrás dela, que já morava em outro lugar. Achou o apartamento por informações alheias e a encontrou com uma bacia na cabeça. Ela o viu, e na hora, segundo os próprios movimentos do apaixonado, tapando o rosto com a bacia, pediu que se retirasse para depois, só depois, falar-lhe - este já é um momento "indignante" para o homem. A mulher havia passado tanto tempo longe dele e não o recebera com o calor do amor antigo? -. Depois quando a viu mais tarde, e aí conta de forma rápida, teve o desprazer de ouvir de sua amada que por causa de outro senhor não o amava mais.
Pouco andou depois disso e chorava, chorava. Não tinha vergonha de admitir...
Parece que tinha falado bem mais do que foi passado no filme, mas termina de forma sincera admitindo que até hoje não encontrara o amor de sua vida e que a italiana nunca iria sair de sua memória.
Ego ou amor?

Ah, a música? Nem me lembro qual era...

* Cachaça Cinema Clube: para quem não conhece, acontece mensalmente no cinema Odeon, no centro da cidade do Rio de Janeiro. É um evento fantástico que reúne cinema (curta-metragens), cachaça e música. São reproduzidos curtas com diferentes temas em cada edição e a cachaça é sempre a mesma -cuja marca me foje a memória- e pode-se optar pela amarelinha ou branquinha. O copinho é fofíssimo. Já tem 5 anos de existência e antigamente era anunciado nos jornais. Hoje é boca-a-boca. Somente no dia em que acontece é escrito no outdoor do Odeon "Cachaça Cinema Clube 21h". Essa decisão foi tomada para que não lotasse mais de forma absurda, como vinha acontecendo quando a divulgação antecedia o evento. Hoje, mesmo no boca-a-boca, lota! Os dj's são ótimos e quase que não saio de lá hoje de tão bom que estava. Sim, porque depois de distribuídas as cachaças o espaço de cima do cinema é aberto para dançar!

terça-feira, 12 de junho de 2007

ao amor que não tenho

Eu vejo um deserto. De certo que se amasse, avistava um abismo. Cismo, entretanto, ainda nem te conheço. O preço é o meu tempo, que nem conto e espero - sem esmero, porque você demora. Chora a moça do meu livro e eu penso que podia ser eu. Meu deserto tem o ouro dos tigres, eufrates e capibaribes, que eu guardo sob as pálpebras e talvez você nem saiba. Caiba talvez numa caixa de sapatos - mísero -, enquanto te idealizo. Realizo em um sonho. Medonho demais para ser lido... bandido!

domingo, 10 de junho de 2007

Poema em linha reta

Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)

[538]

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


"Leite, leitura,
letras, literatura,
tudo o que passa,
tudo o que dura,
tudo o que duramente passa,
tudo o que passageiramente dura,
tudo, tudo, tudo,
não passa de caricatura,
de você, minha amargura,
de ver que viver não tem cura"

Paulo Leminski

sábado, 9 de junho de 2007


"[...] Andando ao seu lado, em meio àquela gente que se arrastava pela rua, em direção ao café Strand, levei um dedo à boca e toquei meus lábios, aqueles lábios que haviam beijado os dela, um pouco como se esperasse achá-los mudados de alguma forma infinitamente sutil, e, no entanto, memorável. Esperava que tudo estivesse mudado, como o próprio dia, escuro, úmido, carregado de grossas nuvens quando estávamos indo para o cinema mais cedo, durante a tarde, e que, agora, ao anoitecer, exibia um sol alaranjado e sombras movediças, com a grama cortada reluzindo como se repleta de jóias, e um barco a vela vermelho lá na baía, virando a proa e rumando para o horizonte ao longe, que já ia ficando de um azul enevoado.
O café. No café. No café, nós. [...]"

Nada como uma descrição do primeiro beijo.

Páginas 125 e 126 de "O Mar" de John Banville, recomendo.

sexta-feira, 8 de junho de 2007

Sapatinhos mágicos



Era uma avenida larga e de mão dupla em plena orla de Niterói. Fui a essa cidade, considero, então pela primeira vez - pois a outra passagem havia sido há quase 10 anos atrás, nada lembrava da aparência da ciadade. Foi à noite. Conheci rapidamente, de carro, as praias "principais" e o caminho de lá até a Boa Viagem, onde próximo, tem um linda igreja (acho) com muralhas antigas... Não minto que até me encantei com a cidade, e de noite. Queria poder voltar e vê-la à luz do dia para saber qual seria minha impressão.
Os prédios me chocavam de quando em vez, não muito diferente das orlas cariocas e soteropolitanas, onde há pedaços- na carioca, quilômetros e quilômetros- de prédios construídos com altura prejudicial à ventilação do interior da cidade.
Num silêncio acompanhado da espera surge um carro branco à nossa frente. A avenida estava pouco movimentada e o carro parou tranquilo no meio dela para um indivíduo, sentado no banco do carona, tentar se comunicar conosco. Só vi a cena da janela e uma imensa esfera, ou de repente outra figura geométrica qual nome não sei, azul, acompanhando o desenho da sua face. Era uma grande peruca, combinada com um rosto cuja feições eram fantásticas de tão produzidas, boca imensa, cores saltitantes... Pergunta, afetadamente, algo que nesse momento não me recordo, e que no momento, estava, provavelmente, concentrada na plasticidade daquela tomada. Só que aos poucos fui procurando interagir com os olhos, estava segura de mim, ela, a Drag, queria era a atenção dos homens que estavam presentes, mas eu despertei nos olhos dela interesse quando viu meus sapatos. "Oh, olha os sapatinhos dela.". Sim, são vermelhinhos, como os da Dorothy, mas sem salto. Todo purpurinado. Assim que vi a paixão pelos meus mágicos calçados perguntei também afetada, e hoje admito, me arrependo, se ela -ou ele, toma no sentido que quiseres- tinha gostado.
"Amei!! Você também é Drag??" perguntou articulando bem as palavras e sílabas. Me segurei e perguntei por quê, se parecia que era. Ela respondeu que com aquele sapato imaginou que fosse, e depois, bem firme sorri: "Vou tomar como um elogio, querida.".
Agora vejam como os meus sapatos são mágicos. Atraem até drag queens afetadas -um pouco reduntante esta frase, reconheço.

quarta-feira, 6 de junho de 2007

A Preguiça.

Conheci a Preguiça há muito tempo. Na verdade eu sabia de sua existência desde muito pequena, mas desprezei-a durante um tempo. Achava pessoas mais legais para conviver, a Brincadeira, os irmãos Pulos e Saltos, e a Preguiça, a Preguiça eu sempre excluí na minha infância.
Depois de um tempo, quando comecei a crescer, a conhecer a Responsabilidade e não saber normalmente como lidar com aquela personalidade confusa, conheci a Preguiça. Conheci mesmo, dei crédito para ela manifestar-se e comecei a me interessar por alguns de seus discursos.
Fomos convivendo assim, primeiro nos conhecendo, depois ganhando uma intimidade... E como sabem, intimidade é foda! Brigamos muitas vezes. Ficava puta quando ela me trocava por outro(a), ou quando queria ficar grudada demais em mim. Relação conjugal mesmo, parecia.
Na verdade até hoje continuamos assim. E foram anos de convivência. Hoje assumo, bem-resolvidamente, que a Preguiça é minha maior inimiga e grande companheira.
Vocês conhecem a Preguiça?

De onde vêm as coisas do pensamento?

"Eu comecei cantando moda, sabe?
Música, comecei cantando música... aí depois a gente tava na rua tudo, coisa e tal, aí eu cantava uma música, batia na lata de doce, ele cantava também e batia, sab? na latinha de doce... agora... não sabia bater... batia, de qualquer jeito éé...era jeito, pra gente, sabe?...num sabia de nada ainda, né? aí depois chegou tanta coisa no meu juízo, sabe? que a gente comecemo cantar mermo, e depois ... e eu olhava assim, pro mundo assim... que chegava tanta coisa em meu pensamento que eu nem sabia da onde vinha. Aí comecei direto mermo, sei que até hoje, graças a deus, venho cantando, e até hoje, graças a deus, num passei fome..."

Menino que fala no início do cd do Lenine " O dia em que faremos contato".

segunda-feira, 4 de junho de 2007

"19 vezes eu".

Com 19 anos recentemente completos, quase duas décadas, é natural surgir aquelas pequenas crises existenciais quanto ao tempo de vida e o que será/foi feito durante este. E para exagerar bem, surgem aquelas retrospectivas também. Sim, aquelas que normalmente vemos em filmes ou ouvimos em histórias de quem quase chegou no "céu" e assistiu a um filminho com sua vida sendo o tema principal. Pois aqui tentarei transcrever tal retrospectiva. Portanto, seguindo a sugestão, aqui vai, "19 vezes eu".

- Capítulo segundo


Decidi mudar de colégio no Ensino Médio, o Portinari era um antro de patricinhas e mauricinho e estava um pouco irritada com aquilo, me descobrindo cada dia mais rasa por estar convivendo naquele espaço de hipocrisia hierárquica.
Colégio Oficina era o famoso por ter sido fundado por professores alternativos, antes funcionando numa casa, onde nego subia em árvore, fazia pequenique, etc. Já viram que me encantei com a poesia apresentável do colégio.
1º e 2º anos no Colégio Oficina. Grêmio Germinal, grêmio Sapato 37 ( viva Raul!!), passeatas, apelido: Che (Joana é a única sobrevivente que revive estes passados), Magali Mendes, Manxa, João Pedro, Denise, Joana, Pedrão, Diego, Priscila, Lívia e muitos outros foram aparecendo, surgindo e se envolvendo, nos envolvendo, construindo algo que até hoje é sólido e prazeroso. Hoje é memória, e a memória vive, mas o presente também nos interessa e muito.
Foi nesse período que descobri o circo, o circo Picolino, o trapézio, Fafá, Marcinho, a estrela a dois, a cambalhota a dois, o cristo, o fogo, a contorção, os batimentos acelerados preparados para a entrada no picadeiro...
Abandonei o inglês para fazer aulas no Picolino, onde minha mãe também ingressou junto, mais para exercitar o corpo que para sugar dos movimentos.
Aí, no ano seguinte, 2004, saí do circo por motivos que se aqui acrescentados, param todos de ler agora mesmo. "Vou fazer dança, quero muito dançar, não tiro isso da minha cabeça por nada!".
Sim, dança. Lá fui eu. Dança moderna. Martha Graham. Depois.... "Fulana - gente! Esqueci o nome da professora- será que posso entrar na turma de ballet clássico?". Minhas batatas foram apalpadas, com gosto, para depois ouvir que sim, tinha força para ingressar no robotismo que foram os 4 meses de ballet clássico.
Não aguentei e voltei para o circo, agora só no tecido.
Depois saí e voltei para a ginástica olímpica - esqueci de citar meu ingresso nela nos anos do Portinari, onde descobri com uma amiga que amávamos a arte e vivíamos dando estrelinhas nos corredores. Eu, magra e comprida ao lado de várias crianças, brincando e se pendurando pra lá e pra cá, e eu suando, malhando, igual a uma "cuscuzeira", como, um dia, disse uma das crianças para mim.
Meu pai, numa visita a Salvador, me ofereceu a oportunidade de passar um ano fora fazendo intercâmbio, coisa que de início me assustou, de medo e felicidade. Estava chegando o momento de começar a putaria do 3º ano no Oficina, pois como já conhecia os que passavam por tal tortura, queria por tudo fugir daquela prisão massacrante. O intercâmbio era a melhor oportunidade.

"19 vezes eu".

Com 19 anos recentemente completos, quase duas décadas, é natural surgir aquelas pequenas crises existenciais quanto ao tempo de vida e o que será/foi feito durante este. E para exagerar bem, surgem aquelas retrospectivas também. Sim, aquelas que normalmente vemos em filmes ou ouvimos em histórias de quem quase chegou no "céu" e assistiu a um filminho com sua vida sendo o tema principal. Pois aqui tentarei transcrever tal retrospectiva. Portanto, seguindo a sugestão, aqui vai, "19 vezes eu".

- Capítulo primeiro

Rapidamente tratarei dos 3 primeiros anos, que foram imemoráveis, mas que por informações externas sei que se passaram em Belém do Pará, onde meu pai havia sido transferido de São Paulo para ir trabalhar pela Petrobrás, e onde minha mãe se virou para correr atrás do que lhe interessava, tendo sido meu nascimento a salvação de uma vida monótona.
Dos 4 anos até os 16, com um ano de exceção, morei em Salvador. Cidade para onde, mais uma vez, meu pai havia sido transferido, mas dessa vez minha mãe conseguira se instalar como se fosse sua cidade natal- e de certa forma era próxima de, pois nasceu em Jacobina, mas para tratar de tal assunto seria necessário outro post "50 vezes Lucinete". Para mim é a minha cidade natal, assim considerada e com um fundamento aceitável: não lembro nada dos meus 3 anos em Belém do Pará.
Dos 4 aos 10 estudei no Girassol (considerando apenas o substantivo próprio, tratamos como masculino, e não o contrário, como deveria, por ser"escola"). Foram anos que não me marcaram tanto, pelo menos conscientemente. Na verdade a parte da minha infância é um pouco sem graça por conta da memória que não ajuda a recordá-la. Mas posso ir trabalhando isso e depois de um tempo considerável de terapia desembestar a contar "causos" infantis.
Construí uma amizade importante no Girassol que hoje perdeu sua importância, não na minha memória, mas na vida concreta. Outra não foi construída no Girassol, mas a semente foi plantada lá.
Depois foi a decisão da mãe de ir morar um ano na Alemanha e deixar-me com meu pai no Rio de Janeiro e meu irmão, aos 19, sozinho em Salvador. Para tomar essa decisão teve de me aguentar chorando dias e noites insistindo que nunca me adaptaria à vida carioca e que odiaria aquilo tudo.
Ceat. 5ª série C. Construí amizades e sementes riquíssimas. No início de difícil adaptação, em casa e fora, mas depois muito bem descolada consegui me sentir em casa.
Voltei para Salvador e ingressei no colégio para onde todos do Girassol iam no ginásio, só que por atrasos do meu pai, cidadão de um mundo abstrato, não conquistei minha vaga no período matutino, onde estavam todos os ex-amiguinhos girassóis, e fui mais uma vez obrigada a passar por uma nova adaptação na 6ª série.
Dos 12 aos 14 estudei no Portinari. Sempre à tarde, pois aí já estava ciente da minha capacidade de adaptção rápida e bem sucedida.
Tenho amizades eternas que foram construídas nessa época. Mas foram poucas, comparada aos anos que se seguem.

Laranja com banana e mel.


Será que isso aqui está tomando o espaço e tempo que deveria ser do meu diário?
Não, mais um vez devo estar arrumando uma desculpa para justificar o fato daquele estar parado e rabiscado apenas nas suas primeiras dezenas de páginas, que as últimas contêm quase sempre o conteúdo, mais ou menos assim: a partir de hoje farei o possível para reservar este tempo, pré-sono, a você, escreverei minhas ânsias, meu dia, minhas dúvidas, minhas certezas. Mas sempre me corrompo.
É a preguiça que me corrompe? O medo do desabafo? A falta de prática?
Por aqui sinto-me ainda na mesma barca que me senti nos inícios dos diários, no início do ano, quando me prometo compromisso total, e acabo neste período escrevendo muito mais do que no resto de tempo que deve ser o triplo desse.
Ih, pode ser então que este blog tome o mesmo rumo... Ou não! Aqui o compartilho.
Joana será a responsável por despertar em mim o tesão quando este estiver se perdendo (vixe, coitada de ti, né Jô, só agora explicito-lhe a responsabilidade para com esse blog, que ainda não sabia! :P)
Mas pode ser também que exista outra possibilidade, que é também tão provável quanto as outras: esse blog pode me despertar o desejo de escrever cada vez mais e acabar levando isso para o diário também, onde escreverei o que aqui não convém escrever. Hum, prefiro essa alternativa.
Só que agora vou me concentrar no meu final de vida boêmia e início da rotina: vitamina de laranja com banana e mel, recomendo.

domingo, 3 de junho de 2007

doces homens!

Como são divertidos os homens! Seres tão bobos, mas tão adoráveis! Como suas verdades são frágeis como vidro diante de uma mulher que por ventura os encante!

Contarei aqui a brevíssima travessura que cometi ontem, quando tomava uma cerveja gelada e deliciosa com amigos maravilhosos e enquanto ouvia um cover bêbado de Louis Armstrong cantar bem na minha frente.
Encontrei um amigo na mesa ao lado, saudei-o com furor e contei-lhe o evento embasbacante que acontecera comigo na noite anterior - vos contaria agora mesmo, mas de súbito julguei que a tal história merece a devoção de um post inteiro. Confiram em breve.
Pois bem, eu contava, tagarela, e ele me fitava como um gavião. Eu estava de batom vermelho, toda prosa. Ele arriscou o primeiro bote em vão, como seriam todos os botes daquela noite.
Um pouquinho bêbada, lembrei com pesar do desfalque que outro amigo ali presente me causara, quando furtou minha inseparável rosa vermelha de prender o cabelo para inteirar a cena da filmagem de um videoclipe na noite anterior.
Então eu avisto, sobre o charmoso balcão do bar, um imenso balde repleto de rosas vermelhas. Todas lindas e obscenamente sedutoras. Todas me tentando como podiam: "Roube-me! Ponha-me em seu cabelo!"
Virei para o meu devoto amigo e sentenciei secretamente: "Um homem de verdade já teria roubado uma daquelas lindas rosas para mim…”.
Acreditam que o cabra titubeou? Protestou, mas usando maus argumentos, coitado, e logo pra cima de Joana Cravo e Canela, a autêntica jâmbou-girl, a mais falsa e mais mal acostumada menina do mundo, a cria dileta do sábio Chico Pinto, o que ensina irresponsavelmente à prole que o verdadeiro apaixonado roubaria um banco, se fosse este o desejo da amada.
Estupefata, falei algo como "Você já foi melhor" e me sentei, impassível. Era demais pra mim. Mas que delicioso teatro!
Percebendo a tensão, o pobre mancebo resolve tentar reparar o acontecido e irrompe bar adentro, buscando um ângulo em que pudesse cometer o furto sem ser percebido.
De repente ele volta, mas sem rosas na mão. Ignoro-o. Como um cachorrinho, suplica: "Mas nega, eu tentei". Fui boazinha e deixei que se explicasse:
"Nega, eu olhei pro lado, não vi ninguém e fui pegar a rosa. Puxei uma delas, mas parecia que tava presa. Parecia que tava enterrada. Tentei outra e nada. Puxei uma e de repente vieram todas, era cimento o que prendia, eu acho. De repente o dono do bar apareceu do meu lado, gritando: 'Ei! O que você esta tentando fazer? Largue isso!'. Aí eu larguei, né nega."
Ohhh…
Sorri internamente e fui pregar a peça com outro amigo. Uma boa peça, diga-se, recurso interessante para ensinar deliberadamente alguma arte do amor a esses pobres moços de coração gélido.
Pra convencer o segundo, careceu uma certa dosagem de drama com o veneno de uma mentirinha: “Ah… Você não sabe o que aquele bobo acabou de fazer. Ele recusou meu pedido…” e contei.
Logo depois ele volta, lívido, mas aí eu já estava rindo demais... tadinhos. Eu não presto.

Freud explica.

O coração tem uma capacidade involuntária de contração, de comoção, de distorção, de paixão...
Sim, involuntária. Tem momentos que simplesmente nos pegamos seguindo-o, como quem anda sem rumo e é levado precisamente por uma força externa a um lugar, a uma viagem, a uma sensação, ...
Quando isso acontece é engraçado perceber como a consciência acorda e tenta impedir, ou invadir mais ainda o momento proporcionado. Momentos que tentamos decorar, desenhar em nossas cabeças os traços, as sombras, as tonalidades. Momentos que fazemos grande esforço para mais tarde recordar o que foi dito, cantado, sorrido... Este é o bom lado da consciência, ruim é quando ela vem à tona para "brochar" uma tentativa de se deixar levar pela maré, leve e relaxada.
Bom é ouvir a consciência sempre?
Difícil é reconhecê-la, em certos momentos.

sexta-feira, 1 de junho de 2007


O universo é um presente. Só se surpreendendo com um pôr-do-sol destes por trás da nossa janela para se curar as feridas internas.

Chico no telão.


O evento era "Chico no telão". O show foi no Circo Voador, mas como parte das pessoas, que eu conhecia, pelo menos, não havia comprado ingresso, o telão foi a salvação. E foi mesmo.
Cheguei um tanto atrasada e de longe, ao olhar a multidão em frente ao telão, já me deu um aperto do medo de estar insuportável escutar e assistir Chico cantar. Mas não. O público de Chico, graças, é comportado. E cantando parece contagiar todos com seu ar calmo mas feliz. Eu olhava boqueaberta para o homem, o homem que na casa dos seus sessenta continua belíssimo, que não canta bem, musicalmente falando, mas que articula e intenciona as letras como ninguém.
O azul de sua camisa, o verde de seus olhos, sua voz, tudo, o conjunto, parecia embeber o povo que numa heterogeneidade sentia-se um só: adoradores de Chico.
Tudo que fazia era motivo para suspiros. "Ó, você viu a jogadinha de ombro? Que sutil... que lindo!". E numa pausa avistei grande amigo próximo e até ele corri, parece até que essa energia nos fazia atrair quem gostamos, e durante o abraço começou "Você só dança com ele e diz que é sem compromisso, é bom acabar com isso [...]", só o Chico mesmo!
E na terceira ( eu ainda acho que foi segunda) volta ao palco, finalizou lindamente com:
" Você era a mais bonita das cabrochas dessa ala
Você era a favorita onde eu era mestre-sala [...]"

Ê! Chagall circense.



quinta-feira, 31 de maio de 2007

A luz azul.


"Olha, Maira, olha para cima. Está vendo? Hoje é a lua azul!", me disse Amaralina no intervalo que dei para respirar do jongo que dançava na Lapa, e continuou "Então presta atenção: você vai procurar alguém e à meia-noite precisa olhar nos olhos desta pessoa e beijá-la, depois disso olhe para a lua que assim ficarás para sempre com essa pessoa!". Ai, Amaralina, que pesado, vai que eu beijo um cara nada-a-ver? Quero ficar pra sempre com ninguém não, disse. "Ai, mongol, 'o pra sempre sempre acaba' ".
Beleza, então. Vou dançar meu jongo e ir procurando olhos, olhos bonitos, interessantes, com boas energias... claro, se afinal terei de viver um "sempre" com a pessoa, tem que no mínimo possuir tais qualidades. Ai, olhei no olho dele mas não é nada disso. Merda... Vamos ver se outro olha. Ih, esse, deus é mais! Ai, esse também não.
Inventei de procurar mais pra longe os olhos pros quais olharia e depois concederia à lua a realização do desejo. Alguém quer ir comigo rodar pela Lapa? Não? Ninguém? Então vou só, pois como disse Amaralina, a lua azul só aparece 2 vezes por ano.
Não. Você não!
Sim, sou seletiva sim, e acho que foi por isso que perdi o momento de aproveitar a presença da lua azul.
Vai ter que ficar para a próxima.

quarta-feira, 30 de maio de 2007

À friaca.


Cofraternizemos o bom vinho tinto.
E uma pergunta: por que o acasalamento é algo tão complexo?

terça-feira, 29 de maio de 2007

Conversa de msn entre pai e filha

Joana diz:
paiêee

Chico Pinto diz:
oi fia. separei o livro pra você ler sobre Rashomon.

Joana diz:
eu nao leio nada, papai. eu sou uma especialista em orelhas de livro, esqueceu? estou tentando escrever aquele seu argumento.

Chico Pinto diz:
qual?

Joana diz:
“a ultima canção”

Chico Pinto diz:
hummmmmmm, adoro essa idéia.

Joana diz:
pensei numa coisa. é um cara, um meio fã que mata ela, certo?

Chico Pinto diz:
acho que na idéia original, era um amor do passado que aparecia naquela noite e pedia uma música que foi deles.

Joana diz:
que massa! que nem casablanca!

Chico Pinto diz:
que nem todos os casais do mundo.

Joana diz:
e ele pode matá-la porque ela nao se lembra de alguma coisa?

Chico Pinto diz:
não, ele a mata por algum motivo bem mais grave. algo relacionado com o fim da relação, uma traição... anos e anos curtindo o ódio e o ressentimento.

Joana diz:
oxe, mas eles têm relação? ele não é amor do passado?

Chico Pinto diz:
eles tiveram... então, minha filha! calma. um homem entra num bar e assiste a um show de uma cantora. ele pede uma música, a última que ela canta. ela é encontrada morta num beco próximo. a polícia descobre na mão dela um bilhete com o pedido da música, a última canção

Joana diz:
e porque afinal ele mata ela??

Chico Pinto diz:
ele a estava procurando. eles tiveram uma relação no passado, interompida por uma fuga dela, uma traição.

Joana diz:
e isso lá é motivo pra se matar numa noite, depois de pedir uma canção!?

Chico Pinto diz:
tem o contexto, isso aqui é só um pobre resumo de um pobre roteirista mamão.

Joana diz:
pô meu paiii

Chico Pinto diz:
calma... é um bom começo. e uma traição é sempre um bom motivo pra matar.

Joana diz:
hahahahahahahahahahahahahahah

Chico Pinto diz:
pergunte a quem foi traído.

Joana diz:
pra mim uma traição é pouco, pra esse caso.

Chico Pinto diz:
né não, filha. eu posso pintar pra vc essa história com tintas fortes, cores quentes

Joana diz:
então pinte! pra mim ela deve ser uma mulher que nao quer compromisso com ninguem, e a obssessão dele por tê-la é o que o faz matá-la!

Chico Pinto diz:
nãoooooooooooooooooooooooooooooo

Joana diz:
ahh! ou voce me diz como é ou vai ser assim! hahahahahaha

Chico Pinto diz:
rsrsrssrs...... o "não" foi pra idéia do compromisso. eu prefiro uma tragédia clássica.

Joana diz:
então conte mais, como é que ele chega ao bar?

Chico Pinto diz:
ele passa anos investigando, ela rodou bastante. ela perdeu o amor por quem trocou ele.

Joana diz:
hummmmmmmmmmm

Chico Pinto diz:
ficou amarga, deixou de ser uma cantora de sucesso promissor pra cantar em lugares de quinta, mas ele nunca esqueceu. de certa forma, ela já esperava que ele um dia chegasse. quando o bilhete chegou até ela, ela sabia q era ele

Joana diz:
ela finge que nao entende e apenas canta?

Chico Pinto diz:
era uma música que tinha saído faz tempo do repertório dela. ela se entrega à morte. sabia que o dia dela chegara.

Joana diz:
cantar a música é entregar-se à morte!

Chico Pinto diz:
mais ou menos.

Joana diz:
uhuuuu, bala

Chico Pinto diz:
tá melhorando?

Joana diz:
tá indo bem!

Chico Pinto diz:
humm, e quem narra a história?? arráaaa... vc tem que ler o roteiro de Rashomon...

Joana diz:
bom, mas acho que esse assassinato tá muito morninho. muito morninho alguem cantar e saber que vai morrer

Chico Pinto diz:
não meu bem, não tá morno.

Joana diz:
muito morno sim.

Chico Pinto diz:
no.

Joana diz:
tá sim, ele vai, arrasta ela prum beco, e pá, mata?

Chico Pinto diz:
vc não está conseguindo enxergar como a história deve ser contada.

Joana diz:
então não estou mesmo.

Chico Pinto diz:
a morte no beco é o q menos importa. pense na história. pense no ponto de vista. podemos interferir colocando um personagem que vai desvendar a trama, talvez um irmão dela, uma irmã... alguém que chega avisado da morte dela, que descobre coisas no quarto dela.

Joana diz:
a irmã ou a policia?

Chico Pinto diz:
a irmã, é melhor.

Joana diz:
alguém como uma irmã pode entender o que significa aquele bilhete, certo?

Chico Pinto diz:
o bilhete só tem o nome da música.

Joana diz:
sim, e a irmã nao pode conhecer a historia dos dois com essa musica?

Chico Pinto diz:
não, ninguém conhece. outros elementos achados no quarto ampliam a visão da polícia.

Joana diz:
afe!!!!!!!!!

Chico Pinto diz:
minha filha, cinema não é ciência exata. tem que deixar a imaginação viajar. tem q colocar tensão na trama.

Joana diz:
eu sei, meu pai... acho que eu sou anta! nada disso esta se configurando na minha cabeça.

Chico Pinto diz:
bobagem. vc é uma menina q está começando a pensar nessa coisa, roteiro é técnica
e imaginação, e nada se resolve numa conversa de 5 minutos pelo msn, ok?

Joana diz:
uii! pode resoolver sim, viu.

Chico Pinto diz:
não, tem é muita ralação. roteiros são escritos em meses, as vezes anos... calma moça!

Joana diz:
vamos fazer uma oficina de roteiro igual em "me alugo para sonhar"

Chico Pinto diz:
e quem vai ser o professor?

Joana diz:
nao precisa, ne? voce lembra como foi feito esse? garcia marquez não deu o argumento todo com detalhes e podava as sugestões a seu juízo.

Chico Pinto diz:
mas tem q ter um mediador

Joana diz:
você!

Chico Pinto diz:
eu não, tem gente de cinema na Bahia que pode fazer isso

Joana diz:
acha que alguem ia querer?

Chico Pinto diz:
vc precisa ler pelo menos um manual de técnica de roteiro. eu tenho roteiros de filmes famosos tb, tem q ler... leia o argumento de Rashomon. tá aqui separado pra vc, poucas páginas.

Joana diz:
engraçadas as suas técnicas de sedução para capturar os filhos na leitura, sabia? as coisas que voce fala...

Chico Pinto diz:
rssrsrsrsrssrsrsrssrsrsrssrsrs

Joana diz:
o terrorismo que voce faz...

Chico Pinto diz:
a paixão que desperto? foi isso q entendi?

Joana diz:
você dizendo "minha filha, voce nunca leu fausto de goethe??? gente, estou preocupado com Joana."

Chico Pinto diz:
passar pela vida e ter podido teclar com voce pelo msn sobre um argumento pra um filme, já terá valido a pena por pelo menos algumas dúzias de eternidades

Joana diz:
algumas CALPASSSSSS*

Chico Pinto diz:
isso. e vc me preocupa mesmo, e sempre será assim. sua boba, vá pensar na idéia.

Joana diz:
ja to escrevendo uns negocios

Chico Pinto diz:
vou "forçar a barra" pra vc ler pelo menos uns três livros de cinema.

Joana diz:
certo

Chico Pinto diz:
filha, vou sair. bjs e não demore pra dormir

Joana diz:
ixe, ja tá é tarde. um beijo papai! boa noite, bons sonhos

Chico Pinto diz:
bjs

Joana diz:
(L)(L)(L)




***CALPA é uma medida de tempo que Borges explica em um dos capítulos da conferência das Sete Noites, mas não sei exatamente em qual. Pelo que me lembro, é mais ou menos assim:
Imagine que um anjo, com a mão mais leve do universo, pegue um lenço, da seda mais pura que existe e passe delicadamente e apenas uma vez em um dos lados de um imenso muro de ferro. Ele faz isso a cada 600 anos e, repito, apenas uma vez. Uma calpa é o período de tempo que demora para este muro GASTAR TOTALMENTE.
Ainda há uma outra explicação, mais prejudicada na minha lembrança, onde Borges diz que uma calpa corresponde a um lago, onde há uma argola boiando, sempre, e onde mora, no fundo, uma grande tartaruga. Ela precisa subir à tona para respirar apenas uma vez a cada 600 anos. A argola mede exatamente o diâmetro da cabeça da tartaruga e o lago é imenso, portanto, é remota a possibilidade da tartaruga acertar a argola em cheio. Uma calpa, nesse caso, corresponde a certa centena de vezes em que o pescoço da tartaruga atravesse essa argola.
Legal, ne?

Rolar, deixar rolar.


pensou em desistir
desacreditar
deixar passar ...

força, acima de tudo
segura firme
vamos lá!

depois esqueceu
deixou rolar,
acabou por se entregar!

Juca Peru.


Queria contar uma historinha da minha casa, de onde agora sinto falta e acredito ser saudável lembrá-la...
Numa rua onde o asfalto nunca havia pisado, onde a chuva encontrava um berço comprido para ninar, existia uma casa, de número 563-E, com duas castanheiras em frente, dispostas de forma simétrica com o portão, proposital ou não, vai saber.
Essa casa era muito pequena antes de uma família decidir lá morar. Saindo de um bairro "bem localizado" na cidade de Salva-a-dor* , Imbuí , a família resolve mudar-se para um ambiente arejado, distante, onde pudesse se acomodar à moda antiga, dos campos. Onde fosse possível mostrar à nova geração um pouco do que se viveu há tantos anos atrás e saciar o desejo dos pequenos de possuir animais de estimação.
Lá se foram, para a rua Mucambo, estrada de barro, clima de interior, sítio enorme e barato, para seu tamanho. Vizinhos que pareciam estar por ali pelo mesmo propósito, um ideal um tanto "alternativo", sim, o tempo de convivência explica as aspas.
A casa estava em decadência. A família resolveu então reformá-la. Com um ideal de assumir totalmente o caráter interiorano, resolveram contratar trabalhadores da própria região, para fazer o capital circular por aquele meio. E sabe como é, foram meses árduos de trabalho. Pilastras construídas apenas com 10% do cimento comprado- o resto está, provavelmente, sustentando a laje do sujeito- e retardando, assim, o processo de evolução da construção... Mas finalmente ficou "pronta" -mais uma vez, a experiência e convivência explicam as aspas.
A família feliz muda-se! O fiat Uno prata fica estacionado no quintal verde com sementes já afundadas preparando-se para colorir o novo lar.
Passado anos a casa já tinha galinheiro, cachorros, muitos passarinhos, minhocas, de quando em vez cobras, aranhas, gatos-do-mato, etc.
Até que foi decidido adotar-se também um peru e uma perua. Ah, já existia um casal de gansos, que merecem destaque rápido. Brancos e felizes. Fazem tudo juntos, o homem defendendo e protegendo sua mulher em toda e qualquer situação. Banho? Tomam juntinhos, cada qual com sua privacidade individual, se respeitando e amando. Um luxo ter em casa tal exemplo amoroso.
Voltando ao casal de perus. Pois foram comprados. Juca Peru é o nome do homem, e a perua, coitada, virou Perua mesmo.
O Juca Peru sempre foi atacado. Não sei se todos perus são assim, haveria de ter tido outras experiências. Mas Juca Peru tinha um "quê" de afetado - bom, não sei qual a palavra mais adequada pro momento.
Qualquer um que saísse ao quintal e desse de encontro com Juca, era fuga na certa, ou então luta, sim, ele pulava com as duas patas para cima da barriga do que mexesse com ele. "Escarrêrava mermo".
Alemão, que trabalha na casa até hoje, conhecia-o bem e já dizia que ele "gostava de brincar". Nunca vi muita brincadeira com aquelas unhas e bico, mas... cada louco com sua mania.
Um dia o peru revoltou-se. (Não disse que achava ele estranho? Sempre achei...).
Numa bela manhã, quando Alemão chegou e foi colocar milho para as galinhas... Um alvoroço no galinheiro.
Uma galinha morta! O galo puto da vida e o ganso junto com ele na briga contra o peru.
Sim! O Juca Peru matara a galinha! Quebrara suas pernas e estuprara-a!
Sempre achamos que galinhas são bichos burros. Eu mesmo achava, na verdade até hoje me pego xingando-as. Parecem muito descoordenadas. Odiava ter que entrar no galinheiro para pôr comida para elas, era sempre uma bagunça só, não conseguia observar nenhum tipo de organização que tinham e me questionava sempre como conseguiam viver em grupo sem nenhuma ordem. Mas chegou o dia em que se explicou a ordem do galinheiro. O peru, depois do assassinato cometido, do crime cometido, foi expulso do galinheiro! Ele não poderia ficar mais um minuto lá dentro senão seria esfolado!
Tivemos que construir um anexo ao galinheiro só para o peru e sua mulher.
Ahá! Mas aí estava o problema.
"Um peru precisa de um harém de peruas, não sabia?" disse alguém rindo para minha mãe quando ouvira a história. Ah, aí estava o problema. Os danados são poligâmicos!
Hoje Juca Peru deve ter falecido, depois de conviver em paz com duas peruas, seu galinheiro próprio e suas brincadeiras cotidianas com Alemão. Sumiu. Acreditam que o tenham roubado para comer.
Aí está um pouco da casa onde vivi durante boa parte de minha vida. Que daqui a uns anos serão, numericamente, poucos anos, mas agora, e sempre, terão signifativa importância.

*Por Camila inspirado.

segunda-feira, 28 de maio de 2007

Meu guia.

Ontem, depois daquelas conversas "efeito-pós-terapia" que temos com os melhores amigos, para quem resolvemos contar os mais podres de nós mesmos, fiquei com a pulga atrás da orelha.
Acredito que para todos seja difícil reconhecer dentro de si comportamentos influenciados pelos valores externos, que a sociedade nos impõe. Reconhecê-los já é um grande passo, mas depois, depois de reconhecer que de fato, muitas vezes, nos comportamos tomando decisões pouco próprias, mais influenciada pelo meio que pela nossa vontade, depois de saber disso, que devemos fazer?
Ouvi ontem o que estava precisando há algum tempo, já.
Muitas vezes precisamos ouvir para nos conscientizar de algo que já existia em nós - só como desconfiança, não como fato. Depois de uma opinião outra conseguimos refletir e admitir a veracidade do caso.

A questão que tem me complicado emocionalmente é a graduação, o vestibular, o ensino superior.
Tenho assumido uma postura de quem está decididamente preparada para o tranco e enconrajada a investir neste objetivo. Mas muitas vezes sei que lá no fundo, fundo de alguma coisa, de mim, do inconsciente, consciente, massa cefálica, sei lá, sei que é fundo, sinto a existência de outro desejo que não estimulo.
Será que seria o caso de me dedicar a outros prazeres ?
A faculdade é sim importante, a experiência e o currículo também o são, eu sei. Mas será agora a hora?
Ai, crises...
Que meu Oxóssi do campo me ajude.

The man I love.


"Someday he'll come along
The man I love
And he'll be big and strong
The man I love
And when he comes my way
I'll do my best to make him stay
He'll look at me and smile
I'll understand
Then in a little while
He'll take my hand
And though it seems absurd
I know we both won't say a word

Maybe I shall meet him Sunday

Maybe Monday, maybe not
Still I'm sure to meet him one day
Maybe Tuesday will be my good news day
He'll build a little home
That's meant for two

From which I'll never roam
Who would, would you

And so all else above
I'm dreaming of the man I love"

George and Ira Gershwin

domingo, 27 de maio de 2007

uma refeição

Ah, cozinheiros do mundo, que bom seria se vocês resolvessem de uma vez, em conferência espúria entre os chefs do mundo, decretar boicote oficial aos condimentos preparados de supermercado.
Que delícia é saborear uma refeição com temperos de verdade!
Hoje tivemos um almoço pelo aniversário de meu pai. Entre os seletos convidados, um casal amigo trouxe Pã, a deusa da alegria selvagem, encondida em tomates sem pele e vistosos maços de manjericão fresco.
Apossaram-se do ambiente como chefs que se prezam, dos que vestem o avental da boa cozinha vistoriando desde o primeiro passo até a preguiçosa retirada e lavagem de louças.
Como reza o catecismo das refeições em família, a hora do almoço desse domingo foi quase à hora de jantar. Esperávamos, famintos, beliscando e bebericando paliativos para a fome, chegando quase a saciá-la - ou a acalmá-la, num recurso interessante para degustar com a devoção devida o que se está por vir.
E então, o almoço ficou pronto. Todos à mesa. O chef conferia de soslaio; admirava as travessas, ao contrário dos demais, com parcimônia, acostumado com o próprio tempero.
Gente, que delícia! Comida que faz o tempo parar na primeira garfada. O aroma de cravo, canela e da carne ignota - de nome refinado demais pra esta pobre escriba recordar -, o azeite saboroso, os tomates - que tomates! - poderosíssimos pelatti...
Tudo vermelho e verde, tomate e manjericão, minha combinação perfeita e preferida entre cores e sabores.
De sobremesa, um desbunde açucarado com muito chocolate, morangos e cereja.
Bebi água entre algumas pequenas doses de licor de jenipapo e o vinho tinto do brinde.
Depois, levei duas irmãs e dois cunhados até seus ninhos de amor e voltei cantando, no carro, sozinha, feliz e de barriga cheia.
Agora sento-me para registrar estas sensações, antes que o sabor raro da doce saciedade me escape...



O amor
o blue
Azul
Nu

Nuca nua.


"Ih, vai ficar parecendo um menininho", "É, já está ficando forte, com corpo de homem, por causa da Escola Nacional, agora de cabelos curtos então?".
São brincadeiras como estas que fui obrigada a ouvir e testada a suportar para, mesmo assim, realizar o sonho de ter a nuca livre e nua.
A feminilidade é algo muito complexo. Para uns está nos cabelos, para outros na mentruação, no uso de saias, saltos altos... Mas eu acredito muito bem que de cabelos curtos, na menopausa, com uma calça linda e uma sandalinha rasteira, uma mulher possa, muito bem, ser super-feminina!
E assim estou, com os cabelos curtos e feminina.
Claro, não escondo o uso de pomada, creme para pentear, brincos, batons e blush (sim, parece que sem cabelo resolvi descobrir as artemanhas de uma mulher e seus apetrechos decoradores).
Os cabelos compridos têm um ar já antigo de marca feminina, antes mulher alguma cortava os cabelos curtinhos e batidinhos na nuca, talvez seja do incosciente coletivo de homens, e algumas mulheres, a relação entre feminilidade e cabelos compridos. Pois foram poucos os homens a me apoiar nesta empreitada.
Não demorei a colocar em prática, não. Quando tenho esses "insites" não penso muito depois de decidir de primeira. Se disse "Quero, e vou cortar", minha (meu) querida (o), pode ter certeza de que em uma semana, no máximo - a não ser que a Lua não permita - estarei como disse. Ou pior!
Foi assim que aconteceu. Numa sexta-feira, no ensaio da peça, falei sobre esse desejo antigo de querer cortar minhas madeixas. Sim, acredito que estavam carregadas com uma história, vivências, bla-bla-blá, e queria mudar. Queria dar início a outro ciclo, a outro crescimento e desenvolvimento. Além da vantagem da praticidade. Para quem está todos os dias se exercitando anaerobicamente e aerobicamente, cabelos cacheados e compridos são sérios empecilhos. Então não conseguia cumprir com a regra fundamental de lavá-los dia sim e dia não. Terminava a aula da ENC (Escola Nacional de Circo - repetirei este termos mais vezes, provavelmente) com os cabelos molhados, encharcados - porque para quem me conhece, sabe a cachoeira que limpa meu corpo e alma- portanto, necessitados de um banhozinho.
Por este e outros motivos resolvi, numa conversa descontraída, radicalizar logo, não esperar por mais nada, pelo frio que está por vir, pelo outro tanto de cabelo por crescer, por nada, quero agora, quero hoje! Sim, cortarei amanhã, no sábado, disse. E todos da companhia ficaram meio desacreditados e ao mesmo tempo temerosos que eu cometesse aquela insanidade.
Fui para casa e lembrei não saber em que lua estávamos naquele dia. Oh, não, lua minguante, confirma meu calendário. Não posso cortar na lua minguante de forma alguma. Para meu cabelo, minha vida, minguar? Deus é mais! Mas a lua crescente vai demorar, só daqui a duas semanas, pensava eu. Ah, só que semana que vem é nova. Lua nova! Pronto! Perfeito: renovação, cabelos novos, um novo ciclo... Viva a lua nova! Semana que vem, de nuca nua!
Lembrei de uma amiga que tinha cortado há 2 anos os longos cabelos e deixado apenas alguns caracóis na cabeça. Liguei imediatamente e pedi indicação da figura com quem havia cortado. Werner do Leblon, Lucí, o nome dela. Meu deus, caro, provavelmente, né? Não importa, para uma mudança tão radical vale a pena. Ligarei e marcarei o horário. Que dia começa a lua nova? Quarta-feira.
Estava eu lá, indo de ônibus numa quinta-feira, às 16h, sozinha, à procura da rua Dias Ferreira. Nunca tinha ido ao Leblon, só passado de carro ou ônibus (sempre achei um bairro que mais parecia um shopping ao ar livre que qualquer outra coisa). Cheguei. Werner, aqui vou eu.
"Boa tarde, tenho um horário marcado com a Lucí, por favor." A moça olha um grande papel com divisórias para dias da semana e horários onde escrevia os nomes dos profissionais ocupados. Uma mulher, cortando um cabelo liso e loiro de uma senhora e repicando-o, pergunta "É para Lucí?", "Sim" ouço a recepcionista responder.
Foram uns 7 minutos esperando, que me pareceram uma eternidade. Consegui olhar todo o espaço à minha volta, as pessoas que haviam acabado seu banho-de-salão corrigindo-se nos espelhos, os profissionais caminhando e cada uma que passava ao meu lado encarava, achando que era a tal Lucí, que cortaria meus cabelos. Muita menina moça, pensava comigo então: e se for uma dessas a Lucí? Meu deus, não vou confiar.
A senhora prepara-se para ir embora com os cabelos estilosamente rebeldes e a que cortara seu cabelo me olha "É você a Maira?". Meu deus, ela é a Lucí! "Sim, e você é a Lucí, certo?". Sorridente " Sim, sou eu.".
Em menos de cinco minutos expliquei o que queria. Primeiro ela entendeu que queria deixar só dois dedos de cabelo, então foi direto para minhas quedas apontando que elas apareceriam. Depois de explicado ela se empolgou, disse que ia ficar lindo e começou o processo. "Ah, preciso guardar o cabelo para mandar para minha mãe, tá?"; me deu uma bolsa onde eu colocava meus cachos.
Saí de nuca batida, depois de dois cortes, onde aos poucos foi conquistando minha confiança e lançando mão da tesoura realizava sua idéia.
Combinei com um amigo de sair depois do corte. Esperei-o um tempo na porta do salão, pouco à vontade, acreditando que todos olhavam para meu cabelo e alguma coisa pensavam, alguma opinião tinham, assim como cabeleleiros que no final do corte vinham olhar e eu, através do espelho, via que comentavam a respeito do processo feito pela Lucí, que me pareceu ser uma das mais competentes naquele ambiente.
Meu deus! Nuca, você está linda!
E a partir de então ouço coisas como: Betty Boop, produtora cultural, Amelie Poulain - deste até gostei bastante! - , mulher, mulher mais velha, séria, nada muito diferente de como era antes, linda...
E assim por diante. Será que os elogios foram verdadeiros? Não sei, importa que eu, de fato, renovei e feliz estou com o início deste processo.
(Desculpa pelo tamanho da história, aos poucos aprenderei a sugar parte de meus devaneios e tornar a leitura mais prazerosa!)


A noite embriaga-me de coragem e liberdade.
Perigoso? Talvez. Mas de já, acredito ser bastante útil.
A vontade é de, às vezes, explicitar verdadeiramente, relatar, com floreios superficiais... Mas muitas vezes, não nego, a vontade surge cifrada.
Claro, um motivo para parar alguns minutos e refletir a respeito.
Mas até a gente conseguir "desCIFRAR" esses desejos, oh, aí teremos altas dos terapeutas.

sexta-feira, 25 de maio de 2007





acredito neste espaço
na sua liberdade, no seu acesso
como um horizonte
onde o limite é tão nítido
mas ao mesmo tempo inalcançável

portanto, permito-me
agora, e mais que nunca
o gozo da libertação
a transparência segura

o medo encorajado

Nomes das coisas

E um belo dia, uma amiga e ex-aluna do professor de redação que me daria aula no pré-vestibular, me conta a proposta feita por ele à sua turma de 3° ano colegial:
- Quero que vocês me digam uma palavra que achem bonita.
Talvez por timidez, os ouvintes demoraram a se manifestar. Quando o primeiro se arriscou, a palavra proferida foi "Solidariedade". Depois disso, sentindo-se situados, os demais começaram a dizer outras coisas de bonita simbologia como "amor", "felicidade", "generosidade", "compaixão" etc.
Muito compreensivo e didático, o professor deixou que eles falassem por um tempo, até que interviu:
- Uma palavra que acho bonita é jangada. Jangada... Sozinha, parece um poema.
Minha amiga olhava pra ele, admirada. Não sei se falou uma palavra, mas tinha entendido claramente o que ele quis dizer.
Alguns ainda continuaram, talvez sem perceber:
- Alegria!
- Humildade!
Raramente alguém diferia:
- Cidreira...
Vi outro dia o Jô Soares fazer coisa parecida com a platéia. A palavra de que ele gosta é "carimbo". "Carimbo é linda, tão redondinha... Carimbo!", dizia. Achei ótimo.
Eu gosto de trôpego e de papoula.
E vocês?

55010.

Como foi agora inaugurado, gostaria logo de contar um "causo" que presenciei há 2 dias...
Estava eu voltando da Praça da Bandeira, como todos os dias - salvo exceções grevistas- com o ônibus 434, Grajaú, para ir até a Lapa, pegar um outro ônibus e subir pra casa (pois a preguiça de subir a pé é muitas vezes vencedora da economia de 2 reais). Então... Abri meu livro e começo a ler, não com tanta empolgação. Resolvi ler um livro que meu pai já há algum tempo comprou para mim, sem má fé, queria que estudasse mais história, para o vestibular, e me comprou um livro sobre os trinta primeiros anos depois da "descoberta" do Brasil, ou seja, de 1500 a 1530, mas onde já se viu cair isso no vestibular? Tudo bem, é a história do meu país, não leio só o que me interessa para fazer vestibular, portanto, abri o livro e comecei a lê-lo... Chegando na rua do Riachuelo interrompi minha leitura para dar ouvidos e olhos a uma mulher bonita, alta, de cabelos escuros e lisos, que gritava de forma absurdamente grossa com um senhor. Pelo que deduzi, o senhor havia lhe pedido licença para sentar ao seu lado, onde existia um lugar vazio, mas como estava ele carregando um trambolho, a mulher se irritou, e levantando gritou: "Vai, porra, senta logo! Que merda, já me fez levantar, eu lá sou obrigada a dar lugar para você com esse trambolho?", e claro, o homem retrucou " Que foi? Tá estressada, é? Isso é falta de homem!", e sabe como é, começou o bate-boca bem baixo (nível) entre os dois e o ônibus inteiro de platéia impressionado com a cena. Ela havia se levantado e em pé continuou, em frente à porta traseira do ônibus. Nesse minuto, quando aparentemente a discussão acabara, me virei para frente e meus olhos esbarraram-se com a figura de um homem alto, relativamente forte, com uma roupa de esportista mas sem ter precisamente acabado de fazer, ou estar indo fazer, algum esporte, passando pela catraca do ônibus e com uma feição de um homem centrado e um ar lá longe de revoltado, como o John Travolta interpretando um personagem com caráter semelhante. Ele caminhou em passos ritmados e longos da catraca até a porta traseira onde situava-se a dita cuja. Isso deve ter durado coisa de 7 segundos, no máximo, essa caminhada. Assim que se deparou com a mulher, de forma muito precisa, lançou a mão forte, espalmada, na cara da figura, uma, duas, três e pela quarta e última vez a fez cair sentada na cadeira única do ônibus que fica de frente para o corredor. Durante esses segundos eu senti meu coração acelerar e minha cabeça entrar em curto circuito. "Que faço? Filho da puta! Mas, porra, a mulher foi uma cavala com o senhor também. Vixe, devem ser namorados, casados, ela já deveria estar brigando com ele lá fora e por isso tratara o senhor tão mal. Sim, estava estressada e era, como o senhor dissera, falta de homem. Mas, meu deus, como o homem esbofeta-a assim, na frente de todos?". Sim, isso e muito mais me passava pela cabeça e eu já tremia. Ela caiu na cadeira sentada, com uma sombrinha semi-fechada na mão e a bolsa, que caíra dos ombros, na outra. Seu rosto estava vermelho dos tapas e do choro que já marcava seus olhos e bochechas. Ele gritou neste instante, depois do tapa e de sua queda na cadeira, com um ar muito sério e de quem acabara de fazer algo muito justiceiro, para o motorista: "Motorista, abre a porta!", mas nada aconteceu e o ônibus continuava a movimentar-se, em baixa velocidade, "Abre a porta de trás, motorista!", gritou mais uma vez e então o ônibus deslocou-se para a direita, parou e a porta de trás abriu. Enquanto isso ele já a olhava e eu, que só via nesse momento o rosto dela, entendi que olhava para ele sem reação, e com certa intimidade, dizendo "Pera aí, deixa eu me arrumar. ", como quem pede por favor um minuto para se preparar para a nova bofetada, e a mulher ao lado, só ouvi a voz, pede, com clemência " Moço, pelo amor de Deus, não bate nela não.", mas ele a puxa, como um namorado ou marido ou pai, que não suporta ver aquele show de mimo, e a joga para fora do ônibus. Como até então minha suposição era de briga conjugal, imaginei que fosse descer junto com ela. Mas, pera! Como assim? Ele pede para o motorista seguir viagem e se dirige para a mesma cadeira onde a mulher caíra e se senta! Filho da puta! Será que não a conhecia e cometeu esse ato violento diante dos olhos de crianças, jovens, adultos e idosos, assim? Ai, alguém, meu deus, fazei justiça! Serei eu? Minha vontade é partir para cima dele e meter a porrada, aí sim, aprendemos todos... ou não. Porque ela aprendeu, sim. Pelo menos acredito que não mais tratará algum senhor, ou qualquer um, daquela forma. Mas ele, que aprendeu? Que pode bater assim nos outros em público e que ninguém dirá um "ai" sequer. Merda. Mas que farei, também? Se teve essa atitude pode muito bem estar armado. Por que iria arriscar minha vida nessa situação?
Desci do ônibus chorando e tremendo. Tentei olhar para ele, mas não consegui ver seus olhos, e também não tinha o desejo de encontrá-los. Assim que o ônibus começou a andar pensei rapidamente, "O número do ônibus! Sim, é o que posso fazer, denunciar esse homem!". Olhei fixamente para o número do ônibus com o fim de decorá-lo, depois pensei nas consequências dele poder ter visto isso, mas a gente acaba se arriscando mesmo nesses momentos, e saí à procura de uma viatura. Ali! Tinha achado uma que por coincidência (se é que essa existe) parou pouco mais à frente no sinal vermelho. Corri atrás dela, mas não cheguei a tempo. 55010, é o número do 434 onde vi acontecer esse "causo".